Algumas Questões Materiais e
Formais Sobre a MPV 664/2014
No post anterior enunciei alguns aspectos técnicos das alterações trazidas Ao apagar das luzes no final de 2014! Todos ocupados com as festividades e veio a “bomba”, das alterações predominantemente caracterizadas pelo retrocesso social.
Em que pese
não ter sido muito noticiada, obviamente, e já o faço como uma crítica, pois,
retirar direitos além de inconstitucional, é extremamente mal visto.
Além do que,
estrategicamente aguardou-se o período pós eleição, e ainda em meio as
festividades, onde a menor preocupação da da população em geral, seriam os
aspectos políticos do país.
Críticas à
parte, existem alguns pontos de grande importância legal e constitucional a
serem abordados, ademais, de grande relevância como objetivo de trabalho! Isso
nada mais consiste do que a afirmação da nossa posição como operadores do
direito no intuito de veicular a informação, bem como aparatos legais para o
trabalho, e ainda, para os leitores que não são profissionais da área, para uma
reflexão mais aprofundada e critica das opções politicas, bem como atitudes
sociais no exercício da cidadania.
Como já
forma mencionado no post anterior, a MPV 664/2014 que alterou diversos pontos
da L. 8213/91, dentre estes os maiores reflexos no auxilio doença,
aposentadoria por invalidez e pensão por morte, o que consequentemente afetou o
auxilio reclusão, por tabela, vez que a própria legislação aplica o regramento
da daquela à este.
Sendo assim,
para maiores informações especifica sobre alterações pontuais, remetam-se à
leitura do referido post, vez que este, como prometido, o enfoque deste é diverso.
Iniciemos os
questionamentos e apontamentos formais e materiais:
Quanto
ao Retrocesso Social
O princípio
da vedação ao retrocesso social tem como conteúdo a proibição do legislador em
reduzir, suprimir, diminuir, ainda que
parcialmente, o direito social já materializado em âmbito legislativo e na
consciência geral.
Novas normas
só poder agregar direitos, e nunca restringir!!! Assim, há que se falar que,
quando há essa restrição, há afronta aos direitos sociais.
Quanto à
problemática, o que se materializa com a edição da referia MP, é de ver que no
Brasil houve a não observância, in caso, pelo Poder Executivo, mas podendo
sê-lo também pelo Legislador, ou Julgador, da eficácia das normas
constitucionais atinentes a direitos sociais gerando por conseguinte, vida
indigna, injustiça e desigualdade social.
Da Afronta
a Dispositivos Específicos Da Constituição
Ab initio, nota-se a violação à cabeça do
nossa Magna Carta em seu artigo inaugural:
Art. 1º A República Federativa do Brasil,
formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal,
constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
I - a soberania;
II - a cidadania;
III - a dignidade da pessoa humana;
IV - os valores sociais do trabalho e da
livre iniciativa;
Nesse ponto,
são extensas as argumentações, porem, obviamente, um vez retirando direitos sociais das pessoas,
há uma grande agressão à dignidade da pessoa humana.
Ademais,
encontram-se violados os valores sociais, pois o retrocesso é notório, e ainda
os valores que versam ao trabalho, pois os indivíduos que contribuem ao
sistema, acabam por não poder gozar daquilo que investiu como cidadão.
Não parando
neste ponto, o artigo 2º da Constituição preleciona:
Art. 2º São Poderes da União, independentes e
harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
Ora, meus
caros colegas, não há que se suscitar e questionar uma usurpação de
competência, no caso especifico desta Medida Provisória publicada ao apagar das
luzes de 2014?
Na analise
de uma interpretação teleológica, indaga-se: qual a finalidade social da norma?
Sem é claro,
suscitar o extenso rol dos direitos dos trabalhadores que foram tolhidos, nos
termos que visa proteger o artigo 7º também da nossa magna carta, que visam
sobretudo a melhoria se sua condição social.
Ademais,
convém ainda ressaltar que obviamente o meio mais apto a trazer tais
modificações, se é que poderiam ter sido alteradas para pior, seria através de
processo legislativo regular, e por ato
do poder executivo, o que chega, inclusive a se suscitar a ocorrência de uma inconstitucionalidade formal.
Sobre
a Inconstitucionalidade Formal Da MPV 664/2014
O texto da
Magna Carta em seu artigo 62 dispõe que:
“Em caso de relevância e urgência, o
Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei,
devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional.”
É de clareza
solar quais as hipóteses da edição de uma Medida Provisória, leia-se:
RELEVÂNCIA e URGÊNCIA!
Agora lhes
pergunto, qual seria a relevância e a urgência da edição de uma medida
provisória retrocedendo direitos sociais? Não há qualquer um dos requisitos.
Consiste em um claro processo legislativo com vicio formal de origem!! E está
muito clara a existência desse vicio. Não houve o cumprimento desses
requisitos.
Não se pode
sequer suscitar a existência de relevância e urgência “intrínsecas”, de modo
que a Previdência social não está deficitária, alias, superavitária em 76
bilhões, segundo dados da ANFIP!![1]
Como
fica o Direito Expectado x Direito Adquirido?
Acerca de
sua definição, tem se que o direito expectado é aquele que já preencheu todos
os requisitos para a aquisição do direito, mas, por discricionariedade, ainda
não foi exercido. Hipótese clara que há que ser respeitado o direito adquirido,
imagine-se a hipótese do trabalhador completou o tempo necessário para que goze
de determinado beneficio, mas, por motivos diversos, não ingressou com o pedido,
ou ainda não incorreu em hipótese de risco social que imaginou estar protegido.
Ora, uma vez, alteradas as regras de concessão, o segurado tem o direito
adquirir o beneficio/ pensão de acordo com as regras vigentes ao tempo da
implementação de todos os requisitos.
Imagine-se o
trabalhador que pagou a 20 meses e falece no vigésimo segundo!!
Não deixará
pensão.
Portanto há
uma quebra de Expectativa de direito x Direito Adquirido x Direitos Expectados!!!
O que acarreta
ainda e inclusive uma quebra de confiança quanto a relação estado x cidadão.
Como
conclusão trago a baila novamente e a titulo de encerramento alguns aspectos
acerca da cláusula da reserva do possível, no inicio já suscitada, com forma da
minha manifesta indignação.
Esta não
pode ser invocada, pelo Poder Público, com o propósito de fraudar, de frustrar ou
inviabilizar a implementação de políticas públicas definidas na própria
Constituição - garantia constitucional do mínimo existencial como, emanação
direta do postulado da dignidade da
pessoa humana. De forma que a noção de “mínimo existencial”, que resulta de
determinados preceitos constitucionais (CF, art. 1º, III, e art. 3º, III),
compreende um prerrogativas a serem concretizadas para que se garantam
condições adequadas de existência digna, acesso efetivo ao direito geral de
liberdade, bem como a prestações positivas
originárias do Estado, viabilizadoras da plena fruição de direitos sociais
básicos, com no caso: o direito à assistência social, seguridade, emprego.
Ademais a
Declaração Universal dos Direitos da Pessoa Humana, de 1948 em seu Artigo XXV, prevê expressamente:
“A
PROIBIÇÃO DO RETROCESSO SOCIAL COMO OBSTÁCULO CONSTITUCIONAL À FRUSTRAÇÃO E AO
INADIMPLEMENTO, PELO PODER PÚBLICO, DE DIREITOS PRESTACIONAIS.”
Desta
feita, o princípio da proibição do
retrocesso impede, ou “deveria impedir”:, em tema de direitos fundamentais de
caráter social, que fossem desconstituídas as conquistas já alcançadas pelo
cidadão ou pela formação da complexidade social em que ele vive, vendando
exatamente isso que fora feito pela ora MPV 664/2014, e infelizmente algumas
outras alterações que estão por vir.
Bibliografia
(ARE 639337 AgR, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado
em 23/08/2011, DJe-177 DIVULG 14-09-2011 PUBLIC 15-09-2011 EMENT VOL-
02587-01 PP-00125)
BARCELLOS, Ana Paula. O Direito a Prestações
de Saúde: Complexidades, Mínimo Existencial e o Valor das Abordagens Coletiva e
Abstrata. In: SOUZA NETO, Cláudio Pereira; SARMENTO, Daniel (coord.) Direitos
Sociais: Fundamentos, Judicialização e Direitos Sociais em Espécie. ed. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2008.
BRASIL. MPV 664, de 30 de dezembro de 2014.
Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2014/Mpv/mpv664.htm>
Acesso em: 30 de março de 2014.
CANOTILHO, J. J. GOMES. Estudos Sobre
Direitos Fundamentais. 2.ed. Coimbra: 2008.
MENDES, Gilmar Ferreira, e BRANCO, Paulo
Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 6. ed. São Paulo: Saraiva,
2011.
SARMENTO, Daniel. A Proteção Judicial dos
Direitos Sociais: Alguns Parâmetros Éticos-Jurídicos. In: SOUZA NETO, Cláudio
Pereira de; SARMENTO, Daniel (coord.). Direitos Sociais: Fundamentos,
Judicialização e Direitos Sociais em Espécie. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris,
2008.