Direito
Das Mulheres: “Frágeis Fortes Mulheres”
Este post será dedicado aos direitos das mulheres,
tema de máxima importância e conveniência a ser tratado e disseminado, com o intuito de que as pessoas tomem conhecimento de suas particularidades.
Assunto que é alvo de repercussão internacional, bem
como na órbita interna, e recentemente ocupou as pautas do nosso Supremo
Tribunal Federal com o histórico e importantíssimo julgamento acerca da
constitucionalidade da Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha).
Introdução
ao Tema das Mulheres
Os conceitos introdutórios consistem em notas
extraídas dos slides da 13ª Pós
Graduação em Direitos Humanos que cursei em 2011 no Instituto Ius Gentium
Conimbrigae, na Universidade de Coimbra, Portugal, na brilhante aula ministrada
pela Professora Teresa Anjinho, da Universidade Nova de Lisboa.
Importante ressaltar que os princípios da igualdade e
da não discriminação são fundamentais, e estão intrínsecos ao conceito de
direitos humanos.
As discriminações podem estar relacionadas a
características imaginárias (preconceitos, estereótipos e falsas
representações) ou reais.
Sendo assim, toda luta
feminista passa pelo questionamento da imagem da mulher, que foi
construída por uma cultura machista e patriarcal, que se associa a uma ideia de
determinação biológica a inferioridade – pois elas são, sensíveis, emotivas,
destinada a cuidar dos outros e a reproduzir, devendo, então, permanecerem em
um espaço familiar.
As correntes de pensamento que tiveram grande influência
nas representações e atitudes em relação as mulheres da cultura ocidental
foram: as tradições culturais hebraicas e cristas, a filosofia grega e o
direito ocidental.
Nota-se que todas as correntes citadas tem em comum um
modelo patriarcal como algo natural, baseado na superioridade masculina, uma
visão dicotômica em relação ao masculino e feminino em desfavor às mulheres, e
ainda o comportamento violento contra a mulher como uma expressão natural do
domínio masculino.
Ainda ressaltando os aspectos históricos, a dicotomia
de gênero tornou-se mais evidente com a 2ª Guerra Mundial, período em que os
homens, tidos como fortes e viris, eram convocados a guerrear, enquanto as
mulheres permaneciam no ambiente privado, zelando pela família.
Também a situação politica criada pelo comunismo e
pela Guerra-Fria, como resultado, vieram a reforçar a importância da estrutura
familiar centralizada no pai responsável pela família e sustento e a mãe pelos
afazeres domésticos e filhos, o que dificultou ainda mais a libertação feminina
do etiquetamento machista.
Com o passar dos tempos, os embates feministas
passaram a tomar conta do cenário internacional, por volta do século XIX, inicio do século XX,
principalmente no lado ocidental. Movimentos estes que acabaram por chamar
atenção no cenário internacional, repercutindo nos Direitos Humanos, e levando
ao quadro que hoje nos deparamos.
Atualmente o que se busca no cenário internacional é o
reconhecimento dos princípios da igualdade e da não-discriminação, sem
esquecer, por obvio, da dignidade da pessoa humana, como centro e base no que tange à proteção aos
direitos humanos, buscando quebrar com a invisibilidade das mulheres no plano
internacional, quebrando com a visão banal da subordinação feminina, e ainda
buscando romper com a dicotomia público privada.
Órbita Internacional de Proteção –
Principais Instrumentos:
Convenção Sobre a Eliminação de Todas
as Formas de Discriminação Contra As Mulheres
Tal convenção foi
assinada em 18 de dezembro de 1979, e teve sua ratificação e adesão pela
resolução 34/180 da Assembleia Geral das Nações Unidas.
A base desta convenção
é pautada nos direitos fundamentais do homem, na dignidade e valor da pessoa
humana, bem como na igualdade de direitos dos homens e das mulheres, e dentre
seus objetivos, esta a promoção da igualdade, reconhecendo que, mesmo com os
instrumentos de proteção existentes, as mulheres ainda continuam sendo alvo de
grandes discriminações.
Importa lembrar que a
convenção reconhece, em suas considerações preliminares que a discriminação contra as mulheres viola os
princípios da igualdade de direitos e do respeito da dignidade humana.
Inclusive atentando
pelo fato de que dificultar a participação das mulheres em condições de
igualdade com os homens na vida política, social, cultural, econômica do país
pode ensejar, além das violações já explicitadas, obstáculos ao crescimento do
bem-estar, na sociedade e família, impedindo essas mulheres de servirem o seu
pais e a humanidade.
Pacto de
San José da Costa Rica (22 de novembro de 1969)
Instrumento internacional, adotada no âmbito da
Organização dos Estados Americanos, em São José da Costa Rica, em 22 de
novembro de 1969, que ingressou no ordenamento pátrio por meio do Decreto 678
de 06 de novembro de 1992.
Possui seus princípios consagrados da Carta da
Organização dos Estados Americanos, Declaração Americana dos Direitos e Deveres
do Homem, bem com na Declaração Universal dos Direitos do Homem.
Fundado no respeito dos direitos essenciais do homem,
ressaltando a proteção a que tem direito a proteção pelo fato de ser pessoa
humana, consagrando proteção interna, bem como internacional dos Estados
americanos, prevê expressamente a proteção a integridade pessoal, com a
seguinte redação:
“Artigo 5º - Direito à integridade pessoal
1.
Toda pessoa tem
direito de que se respeite sua integridade física, psíquica e moral.”
Proteção
Internacional – União Africana
Adotada em 1981, e em vigor na
ordem jurídica internacional desde 1986, a Carta Africana dos Direitos Humanos
e dos Povos, em seus artigos 2º e 3 preveem o princípio da não discriminação e
da igualdade.
Importante lembrar que há um
protocolo sobre o direito das Mulheres na África, também chamado de Protocolo
de Maputo (11 de Julho de 2003), e em vigor desde 25 de novembro de 2005.
O Brasil e as Mulheres
É de extrema importância e conveniência no presente
momento, histórico, e ao meu ver paradigmático para os direitos humanos no
tocante às mulheres, o recente julgamento do STF em sede de controle
concentrado de constitucionalidade sobre Lei Maria da Penha que será ao final
deste texto noticiado, com as devidas considerações.
Antes, é de grande interesse ressaltar os aspectos
evolutivos dos direitos femininos, com os instrumentos de proteção, de forma
evolutiva.
A Convenção de Belém do Pará
Esta Convenção entrou
em vigor aos 3 de março de 1995, por meio do Decreto Legislativo 107, de 31 de
agosto de 1995, e ratificada em 27 de novembro do mesmo ano, tendo sido
finalmente promulgada em 1996, no dia 1º de agosto por meio do decreto 1973.
Foi o primeiro
tratado internacional de direitos humanos a elucidar a violência contra a
mulher, e trata-la como um problema recorrente em todos os níveis sociais. É de
enorme importância ressaltar que esta Convenção, em suas considerações
iniciais, ressalta a preocupação com a ofensa a dignidade humana feminina, que
tem raízes históricas de desigualdade entre homens e mulheres, que derivam de
manifestações de poder do homem sobre a mulher.
Outra previsão de
grande valia, trata da atuação estatal ativa, prevista no artigo 7º, em que os
Estados-partes concordam em adotar, por todos os meios apropriados “e sem
demora, políticas orientadas e prevenir, punir e erradicar a dita violência
(...)”, enunciando, em seguida, quais as medidas positivas, dentre elas: atuar
com diligência, prevenindo, investigando e punindo as formas de violência;
incluir na legislação interna medidas protetivas, no âmbito judicial e
administrativo, tomar medidas apropriadas, estabelecer mecanismos de proteção.
Código
Penal: parágrafos 9º, 10º e 11º no art. 129 do Código Penal - alterações de
2004.
Em
resposta a Convenção, alterações ocorreram alterações no Código Penal em 2004,
introduzindo no artigo 129, os seguintes parágrafos:
Violência
Doméstica
§ 9º Se a
lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou
companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se
o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade
Pena -
detenção, de 3 (três) meses a 3 (três) anos.
§ 10. Nos
casos previstos nos §§ 1º a 3º deste artigo, se as circunstâncias são as
indicadas no § 9º deste artigo, aumenta-se a pena em 1/3 (um terço).
§ 11. Na
hipótese do § 9º deste artigo, a pena será aumentada de um terço se o crime for
cometido contra pessoa portadora de deficiência
Todavia,
tais alterações foram insuficientes, de forma que a violência domestica e
familiar passou a avolumar enormemente os Juizados Especiais, transformando-se
em infrações bagatelares.
L. 11430/2006 – Lei Maria da
Penha
Este
trecho é uma analise do panorama atual, com base na recente decisão, e nas
discussões que antecederam, bem como na ADI 4424 (que pode ser lida pelo
seguinte link: http://pfdc.pgr.mpf.gov.br/temas-de-atuacao/mulher/combate-violencia/atuacao-do-mpf/ADI-4424-leimariadapenha_PGR.pdf
).
Acerca da lei, e com muita perfeição Flávia Piovesan
preleciona que “o grau de ineficácia da referida lei revelava o paradoxo de o
Estado romper com a clássica dicotomia público-privado, de forma a dar
visibilidade a violações que ocorrem no domínio privado, sob o manto da
banalização em que o agressor é condenado a pagar à vítima uma cesta básica ou
meio fogão, ou meia geladeira... Os casos de violência doméstica ora vistos
como mera ‘querela doméstica’, ora como mero reflexo de ‘ato de vingança ou
implicância da vítima’, ora como decorrentes da culpabilidade da própria
vítima, no perverso jogo de que a mulher teria merecido, por seu comportamento,
a resposta violenta.” (PIOVESAN, Flávia. Litigância Internacional e avanços
locais: violência contra a mulher e a Lei “Maria da Penha”. IN Temas de
Direitos Humanos. 3ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 233.).
Sendo
assim, consagrando a evolução protetiva, em 2006 a Lei 11340/2006, Maria da
Penha, trouxe considerável maior proteção para mulher, mas por anos foi alvo de
controvérsias procedimentais acerca da condição de procedibilidade da ação
penal, bem como ao cabimento dos institutos descriminalizadores da L. 9099/95.
O
recente reconhecimento da constitucionalidade da L. 11.340/2006 (Lei Maria da
Penha), no julgamento pelo Supremo Tribunal Federal na ADI 4424, em que ficou
reconhecida a possibilidade de o Ministério Público dar início a Ação Penal sem
a necessidade de representação da vítima, bem como afastou a competência dos
Juizados Especiais de julgar os crimes cometidos no âmbito da lei.
Sendo
assim, é de grande relevância a proteção e a consagração da dignidade da pessoa
humana com o entendimento adotado, bem como o reconhecimento da necessidade de
proteção daqueles que estão mais vulneráveis a agressões, e após sofrê-las,
merece atenção especial dos poderes públicos para que tenham sua integridade
física e psíquica protegidas.
Conforme se pode extrair das notícias
do Supremo Tribunal Federal, com o seguinte link
(notícia do dia 09 de fevereiro de
2012)
A Corte acompanhou em sua maioria, o voto do ministro Marco
Aurélio (relator), entendendo pela possibilidade do Ministério Público dar
início a ação penal sem necessidade de representação da vítima (ação penal
pública incondicionada).
O artigo 16 da lei dispõe que as ações penais públicas “são
condicionadas à representação da ofendida”, mas, para a maioria dos ministros
do STF, essa circunstância esvazia a proteção constitucional assegurada que é
às mulheres. No caso, ficou também
esclarecido que não compete aos Juizados Especiais (L. 9099/95) julgar
os crimes cometidos no âmbito de proteção da Lei Maria da Penha.
Com
o objetivo STF declarasse a constitucionalidade da L. Maria Penha, em interpretação
conforme ao artigo 41, ficou
decidido que: “Crimes que envolvam violência
doméstica ou familiar contra a mulher não são atingidos pela Lei 9099, por
força do artigo 41 da Lei Maria da Penha. Nesses crimes não cabe nem a
suspensão condicional do processo.”
Ou seja,
o julgamento pelo Supremo afasta a aplicação da 9099/95 aos casos de violência
doméstica e familiar contra a mulher.
Esclarecimentos sobre a Lei 9099/95:
A Lei 9099/95 possui
quatro medidas despenalizadoras:
1.
composição civil extintiva da
punibilidade (artigo 74);
2.
transação penal (espécie de acordo
entre Ministério Publico e autor do fato);
3.
representação da vitima nos crimes de
lesão dolosa leve e culposa (artigo 88), convém lembra que antes da L. 9099/95,
a lesão dolosa leve e culposa era publica incondicionada a ação, todavia passou
ter como condição de procedibilidade a representação da vitima;
4.
Suspensão
condicional do processo.
Quando
da entrada em vigor da Lei Maria da Penha, o referido artigo 41 ensejou grandes
discussões no seguinte sentido:
A
posição inicial dominante na
jurisprudência era a de que os artigos
88 e 89 da L. 9099/95 se aplicaram a L. Maria da Penha (11.340/2009).
Mas a posição alterou-se, desde
2010 no STJ, posição que perdura até hoje, bem no Supremo, com o julgamento de
fevereiro de 2012, os artigos acima
citados não se aplicam a Lei Maria da Penha.
Dessa forma, em caso de violência
doméstica não cabe o instituto da suspensão condicional do processo, e a ação
penal é publica incondicionada.
A
novidade com o julgamento dá-se pelo fato de a decisão ter sido dada em
controle concentrado, portanto com efeito erga omnes no sentido da
constitucionalidade da Lei Maria da Penha.
Conclusão
Estas são algumas breves, mas importantes
considerações a serem feitas, acerca dos direitos fundamentais, direitos
humanos, bem como sobre a importância da atuação Estatal para a garantia do
completo exercício de cada uma dessas prerrogativas fundamentais.
A base histórica das agressões contra as mulheres,
devido ao fato de a sociedade ter se construído sob bases machistas, hoje mais
enfraquecidas nos países de cultura ocidental, devido a grandes lutas, efetiva
atuação dos instrumentos internacionais, e não, sem antes, deixar ao longo da
historia, um passado sujo de violações e agressões.
Vale a pena ressaltar que a dignidade da pessoa e seu
valor interno e internacional, cláusula pétrea que é, deve ser preservado. E
não proteger, por meio de instrumentos, institutos e medidas cabíveis, seria
agredir fortemente valores intocáveis.
Nenhum comentário:
Postar um comentário